Kamila Fernandes
Especial para o UOL Notícias
Em Fortaleza
Criar programas de transferência de renda - as chamadas "bolsas" - deixou de ser novidade na última década por todo o país. No sertão do Ceará, para incentivar a geração de renda, foi anunciada a implantação da "Bolsa Bode": programa onde serão distribuídas cabras e ovelhas a beneficiados pelo Bolsa Família.
O projeto foi criado pela Prefeitura de Tejuçuoca (144 km de Fortaleza), município conhecido como "a capital cearense do bode", incrustado no semiárido e com grande parte da população de 15 mil habitantes dependente do Bolsa Família. Segundo a Caixa Econômica Federal, recebem o benefício 2.244 famílias no local.
"A intenção é preparar os jovens dessas famílias a se tornar produtores da ovinocaprinocultura e ainda garantir a compra do leite e da carne para complementar a merenda escolar do município", disse o prefeito Edilardo Eufrásio da Cruz (PSDB).
Para o projeto-piloto, a ser implementado até o final deste mês, serão escolhidas 20 famílias e cada uma receberá dez cabras, dez ovelhas e um reprodutor. O programa será executado em dez meses, com metas a serem cumpridas pelos beneficiados, que receberão um subsídio mensal de R$ 100. Caso as metas não sejam cumpridas, além de perder o recurso, o beneficiado perde a criação ao final do prazo.
"Tem que fazer os cursos de capacitação, tem que construir um cercado, manter os animais vacinados, num ambiente limpo, plantar capim para a alimentação. Quem não cumprir, perde", explica o prefeito. Segundo ele, serão necessários R$ 200 mil para a implantação do projeto, que deve ter parcerias com o governo federal e estadual.
A comercialização da produção também será garantida pela prefeitura, que fará a compra para delimitar um preço mínimo comum a todos os beneficiados e ainda inserir a produção na merenda escolar.
Impacto na pobreza
Para o professor do Caen (Curso e Pós-Graduação em Economia) da UFC (Universidade Federal do Ceará) e membro do LEP (Laboratório de Estudos da Pobreza), Emerson Marinho, a iniciativa parece positiva, pela perspectiva de "não dar apenas a esmola", mas incentivar a profissionalização para viabilizar a saída do programa. Marinho é um dos autores de um estudo que avalia o impacto dos programas de transferência de renda na pobreza, publicado em 2008, no qual se conclui que não há alteração significativa na redução da pobreza no Brasil.
"A principal crítica que se faz ao Bolsa Família e a programas de transferência de renda é a inexistência de um prazo para o término do benefício e a falta de um apoio para a qualificação técnica. Estudos já demonstraram que só a transferência não leva a um impacto na redução da pobreza e pode até levar a um impacto negativo no mercado de trabalho, ao se desestimular o trabalho formal", disse.
"Não dá para imaginar que alguém vá ser contra um programa como o Bolsa Família, que garante a sobrevivência de quem não tem nada, mas é preciso refletir se não há outros meios mais eficientes para garantir não só isso, mas a busca pelo desenvolvimento, dando educação, qualificação."
Projetos semelhantes
Fábio Farias Gomes, da Associação Comunitária de Tejuçuoca, lembra que outro projeto já foi criado no município para a distribuição de animais, no caso galinhas caipiras. Já são 100 famílias beneficiadas com a doação de 60 aves vacinadas e ração suficiente para três meses. Em troca, cada família tem de construir um aviário para a criação adequada. "A ideia era ter comida de qualidade, mas como são muitas aves e tem a produção de ovos, eles também podem ser vendidos, o que acaba melhorando a renda", disse.
No Piauí também há um programa semelhante que já contemplou cerca de 5.000 famílias, segundo o site do governo.
"Bolsas" pelo país
O Bolsa Família é o programa de transferência de renda de maior alcance do país, beneficiando famílias com renda mensal per capita de até R$ 140. O projeto hoje atende cerca de 11 milhões de famílias em todo o país. Só no Ceará são 922.748, segundo relatório da Caixa Econômica Federal referente ao mês de novembro.
Entre os programas de transferência de renda do governo federal estão também o Bolsa Atleta, da Caixa Econômica Federal, que paga R$ 300 a atletas estudantes, e R$ 2.500 a atletas olímpicos e paraolímpicos, e o Bolsa Formação, destinado à qualificação profissional em segurança pública, com um subsídio de R$ 400.
Também há propostas polêmicas, como o Bolsa Celular, que garantiria a distribuição de aparelhos celulares a 11 milhões de famílias do Bolsa Família (custeado, segundo o Ministério das Comunicações, pelas empresas de telefonia), e o Vale Cultura, com proposta de disponibilizar R$ 50 por mês para trabalhadores consumirem produtos culturais - com desconto parcial na folha de pagamento, de acordo com a renda.
* do UOL Notícias